domingo, 27 de fevereiro de 2011

Valsa quaternária

Duas Flávias, duas Fridas.

Uma, completamente partida,
A outra, uma fortaleza.

Uma, manda prender e manda soltar,
A outra, deixa rolar.

Uma amou até perder o juízo,
A outra, sabe lá o que é isso!



Uma se perde em mil elucubrações,
A outra, primeiro atira para depois perguntar.

Uma delas até acha que o destino tem as suas razões,
A outra, não quer nem saber, detesta esperar.

Uma, matriarca europeia e altiva,
A outra, latina e subversiva.

Uma cortou os cabelos em sinal de revolta,
A outra cortou só pra dar uma volta.

Uma é o bordado e o avesso
A outra, fez questão de esquecer seu endereço.

Cara de uma, focinho da outra.
Cuspida, escarrada,
De corpo e alma lavada.

Duas Flávias, duas Fridas:
As duas serão verdade, as quatro serão mentira?

Sei não, pouca diferença isso faz.
Tudo é meio que uma coisa só.
                                                  

27/02/2011.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Movimentos aleatórios

É melhor jorrar as ideias tão logo elas aparecem. TM não é um grande meio de comunicação em massa, por isso que não dá certo fazer pauta. Simplesmente não é sua vocação - nem a minha, que nem jornalista sou.

O que ocorre é: acabei de ouvir o novo álbum do Radiohead. Frase do outro lado da parede:

"Sabe, eles são uns filhas da puta..."

E eu: "Manda matar!"

A minha resposta foi tão orgânica que entendi o tão falado nexo entre o assassino do John Lennon e O Apanhador no Campo de Centeio. Nunca tinha visto relação entre as duas coisas.

Thom Yorke, Ed O´Brien e sua trupe que se cuidem. Aff!



Boa cambalhota noturna para vocês!

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Orientupis, judárabes e ciganagôs

Depois eu reclamo que os TM são um fracasso na blogosfera. Foi só voltar a trabalhar, que parei de alimentar meu bichinho virtual. Mas depois do meu amigo Victor me dizer que toda vez que entra nesse cafundó eletrônico,  ele pira junto comigo nessas brisas todas, lembrei para que eu me tornei fazedora de textículos. (Se você é curioso, leia o primeiro textículo.)

Uma madrugada que se estica demasiadamente - como a última, com uma hora a mais por conta do fim do horário de verão - pode ser de uma surrealidade galopante! Sei disso porque ainda sou bicho noturno.  Mesmo que ultimamente esteja aflorado meu lado solar e diurno, o encanto da noite sempre me atiça. Lua Cheia então, nem se fala! Já até escuto os cães uivando, só de falar.

Mas a cena é: sentados na porta de um supermercado 24 horas depois da balada, com um saco de salgadinhos e uma barrona de chocolate, nem sei como a gente puxa papo com um galego tomando Heineken ao nosso lado. A gente oferece nosso festival de gordura trans, ele oferece cigarros. Eu tinha esquecido os meus e aceitei um. Ele não aceita, só consome produtos kasher (!?). Pegou um Doritos depois de alguma insistência. Era uma madrugada de sábado para domingo, na minha cabeça perguntei: e o Shabbat? Vai até o pôr-do-sol do sábado. Já tinha passado faz tempo.

O garoto é completamente perdido nos seus preconceitos. Começa falando de uma garota de roupa curta, eu pergunto: "Você viu o tamanho do meu vestido? Sou vulgar por isso?". Ele: não, imagina, que isso. Desata a falar mal de católicos, eu conto para que ele está em meio a um papo multicultural e multireligioso - Ele se diz judeu, eu sou católica, o Victor é evangélico. Ele abaixa a bola. Resolve endossar o discurso de que tem nordestino demais nessa cidade, faço questão de contar: minha mãe é paraibana, tão galega quanto você. Está nessa cidade há 40 anos, não está fazendo número, muito pelo contrário: ajudou a construir esta cidade, como todos que vem para cá, de todas as partes do mundo. Ah, sua mãe é diferente.

Resultado: dando a hora do bus, o Victor se enche, levanta e a gente vai embora. Eu não fiquei ofendida em nada, na verdade, ri um bocado do menino. Vi perfeitamente o exemplo da pequeno-burguesia que se sente ameaçada nessa cidade e tenta colocar a culpa do nosso caos justamente nas classes mais pobres, e que aqui definitivamente se fodem muito mais que eles. Gente que reproduz o discurso do PIG achando que têm ideias próprias. Que concebe esse mundo imaginário que se desfaz como castelo de areia com uma madrugada sentado na rua conversando com dois estranhos.

Não gosto de ufanismo, mas senti um grande alívio de ser uma brasileira típica, com pais, avós e bisavós nascidos aqui. Sem exaltar que sou descedente de sei lá o quê, afinal a mistura é tão grande que se preocupar com isso é uma grande perda de tempo. Exaltar origens por aqui é completamente ridículo, não faz o menor sentido. Fiquei com um trecho de um poema do Amor da Minha Vida e duas canções na cabeça - todos falam por si, dispensam comentários. Cambalhota tripla para vocês, minha pequena e querida audiência.

"Para mim, de todas as burrices a maior é suspirar pela Europa.

A Europa é uma cidade muito velha onde só fazem caso de dinheiro (...)
Aqui ao menos a gente sabe que tudo é uma canalha só (...)"

(Explicação, Carlos Drummond de Andrade)





Inclassificáveis!

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Stormy weather

Chamar a natureza de Mãe e crer que ela é sempre bela, poética e provedora é uma ignorância típica de quem só pensa que conhece as mulheres. Mãe pode ser Virgem Maria, ou Medéia e matar suas crias. A natureza pode ser tanto cósmica quanto caótica. E ela é linda no seu caos.

Ai, essa tempestade. Nunca a tinha visto descortinada na minha frente com tanta precisão. Conseguia ver os raios se formando bem ao longe e contava. 1, 2, 3 quilômetros, dependendo do tempo em que demorasse a chegada do trovão.

E tive medo, lógico. Quando me dei conta de que uma sala envidraçada é belíssima, principalmente em dias de sol, com colibris voando em volta, vindo sugar aquela aguinha com açúcar que costumam deixar perto dos jardins, mas que a esta mesma sala pode ser também assustadora, em dias chuvosos como este. Quando não se intui o tamanho do toró, porque ele se mostra inteiro na sua frente, feito tela de cinema, com o barulho do granizo batendo no vidro contribuindo com o realismo da cena. A imagem de revista de decoração vai embora pelos bueiros entupidos da cidade e fica apenas a exata noção da vulnerabilidade, de estar de frente para aquela vista privilegiada justamente porque estamos na frente de um barranco.

Ai, essa tempestade. Nunca ela traduziu de forma tão perfeita o meu estado mental, sala envidraçada de cara pro barranco, aprendendo a fechar as cortinas de vez em quando.