segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Melancholia

Nunca pensei que melancolia tivesse algo a ver com o mito de Narciso. Melancolia é o desapontamento de Narciso ao ver que não poderia tocar sua linda imagem refletida no lago: sem poder tê-la, morreu vidrado no redemoinho que desmanchava o seu reflexo ao ser tocado. 

Não parece, mas eu sou melancólica. E eu, que bem gosto dessa melancolia, não me assustei quando a minha terapeuta me explicou a visão da psicanálise sobre esse sentimento temido à exaustão por um mundo que insiste em fazer o jogo do contente todo o tempo. Muito pelo contrário, me encantei ainda mais. 

Passei os últimos meses contemplando o redemoinho. Era (ou é) só tristeza: algo tão normal quanto alegria, algo que passa, mas parece ser um crime ficar triste, e não é. É um luxo ao qual eu me reservo quando algo não vai bem.

Por isso gostei tanto de Melancholia, o último filme do Lars Von Trier. O estado melancólico é exatamente aquela sensação de pernas paralisadas que acometeu Justine (Kirsten Dunst). E foda-se se é o dia do seu casamento, ou se o mundo inteiro diz que gostaria de estar no seu lugar e que você deveria estar feliz. A melancolia te abraça, te enrosca pelas pernas e quando elas travam, não tem que as faça seguir.  


No entanto, as coisas mudam diante de um perigo real. Na iminência do desastre, Claire (Charlotte Gainsbourg), sempre tão centrada, se desespera e Justine, sempre tão errática, sabe exatamente o que fazer. Ela que já tinha visto a Melancholia se aproximar tantas vezes, não se assustou e buscou dentro de si a força para suportar o fim. 

Dizem que a depressão é o mal do século. Pode ser, mas tenho para mim que o mal é justamente temer tanto a tristeza, fugir dela como se pudesse fugir do planeta Melancholia. Quando a tristeza bate, quando se vai às lágrimas, só nos resta entrar na nossa cabana invisível. Quem tem medo de tristeza não sabe que isso não tem nada a ver com desistir, muito pelo contrário: é caçar o último fio de força para sobreviver e jamais entregar os pontos. Sucumbir acontece com quem não aguenta o tranco da melancolia se aproximando e saber que não se pode fazer nada. A arrogância humana é tanta, admitir impotência é algo tão inadimissível, que há quem simplesmente não sabe o que fazer, quando não há mais nada a fazer. 

Isso não é só uma metáfora de cinema. Há que se ter pernas fortes para aguentar a vida. Porque estar vivo dói, até quando é bom. Além do mais, não é qualquer soco no estômago que vai me fazer beijar a lona. 

E para quem teve pernas para subir e descer mais uma Colina Melancólica, aquele abraço!